quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Rio Verde

Vamos falar sobre a redução da maioridade penal? Só mais uma vez...

POR | 14/06/2018

Já faz tempo que não falamos sobre isso, ou não?

Vamos falar sobre a redução da maioridade penal? Só mais uma vez...

Redação Jornal Somos

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Foi em 2015, quando o tema teve seus holofotes no Congresso brasileiro. Após uma votação, a proposta que transformaria em 16 anos a idade mínima para ser preso foi derrubada democraticamente. O então deputado do MDB-RJ (e atual detento do Complexo Médico Penal, em Pinhais) Eduardo Cunha não conteve sua frustração e buscou manobras para fazer acontecer a tal redução.

 

Apesar de se tratar de uma cláusula pétrea, ou seja, uma limitação em nossa Constituição, vemos membros do nosso Legislativo usando de meios de comunicação para alimentar em seus possíveis eleitores a fantasia de uma nação que será pacificada graças à prisão de adolescentes infratores. Esses “possíveis eleitores” são parte de uma população cansada do descaso que é a segurança pública e ansiosa por uma resposta confortável a seus problemas – o que não significa uma resposta efetiva.

 

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/1993 que foi aprovada em março de 2015 pela Câmara dos Deputados prevê a redução da maioridade penal para crimes hediondos (como estupro e latrocínio), homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. Quem deveria levar a discussão adiante seriam os senadores, e a proposta foi tombada no Senado pela sua falta de detalhamento.

 

A discussão – que está na Câmara desde 1993 – voltou a ser pauta nesse ano de eleições com uma proposta apontada como menos radical que as anteriores, mas ainda muito semelhante, a PEC 33/2012. Esse assunto polemizado é um paradoxo dentro e fora da política; há aqueles que acreditam que a aprovação trará a diminuição da criminalidade e o outro lado crê que assim só se tende a piorar o atual cenário brasileiro.

 

Quando analisamos quem propõe essa redução, é possível observar um padrão. Esse padrão revela uma parte conservadora dominante da sociedade, assim como o “alvo” dessa redução também se encontra num padrão: de pessoas da parte marginalizada.

 

A proposta mais recente deseja que o jovem a partir de 16 anos responda criminalmente como adulto. Em uma pesquisa, o Datafolha apontou que a maioria da população brasileira (87%) é a favor da redução. Essa parte da população acredita que a medida seria uma forma mais justa de lidar com os menores infratores, já que consideram insuficientes as punições previstas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Além disso, baseado na cultura de países como a Nova Zelândia, onde a maioridade começa aos 17 e na Suíça aos 15, a redução aparenta ser um passo à frente para o desenvolvimento do país. Acreditam também que seria uma solução para o problema de insegurança jurídica causado pela impunidade dos menores. A parcela favorável também vê benefícios para os jovens. Julga-se que os índices de reincidência diminuiriam, já que atualmente os procedimentos para a ressocialização destes jovens são falhos.

Por outro lado é fato que o sistema prisional brasileiro está em crise. O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) mostrou em 2014 que os presídios, apesar de terem aumentado suas vagas, ainda funcionam em superlotação. Isso faz com que as cadeias estejam em situações extremamente deploráveis e não tenham condições de consolidar políticas de ressocialização dos detentos.

Este é um dos fatores que sustenta o argumento em oposição a proposta, já que aumentar o número de prisões no resultou em um país mais seguro. Ademais, a parte da população que é enquadrada e/ou vai presa é uma parte específica: aqueles que não têm moradia e não tem acesso a políticas de educação e saúde, por exemplo. Hoje sabemos que a maior parte da população carcerária brasileira é negra e vinda das periferias. Dessa forma, o encarceramento seria para os jovens o que é para os adultos: uma forma de controle social.

Os adolescentes infratores serão encarcerados pelo mesmo Estado que no passado negou seu direito a educação. Estão sendo julgados pela mesma sociedade conservadora que no passado julgou uma mulher, periférica e pobre, grávida daquele adolescente.

O deputado que recorreu a meios injustos para garantir a tal redução foi preso no ano seguinte por receber propinas milionárias da Petrobras – a revolta de determinada parte da população com seus crimes não demonstrou 10% da agressividade usada contra os jovens da periferia, quando se tratava de jogá-los na cadeia.

Não seria a redução mais um dos métodos da elite manter a periferia controlada e afastada?

De acordo com o professor de sociologia especialista em políticas públicas, Albanir Faleiros, a melhor alternativa para resolver o problema da criminalidade entre os jovens seria o investimento do Estado em políticas educacionais, de esporte e de lazer. Ele acredita a redução seria ineficaz para diminuir a criminalidade e ainda agravaria a crise no sistema prisional.

Para Wellington Castro, empresário, as medidas socioeducativas a que submetem os menores infratores são inúteis e a redução seria a única forma de combater os índices de violência no país. “Não vejo nenhuma alternativa a curto e médio prazo; não temos um déficit na educação que impossibilita a grande maioria desses infratores de tentar vencer na vida. Quem sabe com a prosperidade do país e com penas duras para criminosos para inibir a entrada no mundo do crime, quem sabe pode haver alguma mudança, mas o principal a meu ver é o endurecimento do código penal para inibir.”, afirma.

A advogada Débora Cristina de Freitas declara que este não é o momento correto para uma redução da maioridade penal, e que essa proposta dissociada de outras medidas alimentará o caos já instaurado. Ela alega que é incoerente defender que uma simples mudança de lei irá melhorar a atual situação, e que nenhum sistema jurídico é capaz de sozinho mudar uma sociedade, especialmente quando o Estado não oferece o aparato necessário para que ele seja cumprido integralmente.

“Manter o sistema da forma que está posto ou simplesmente reduzir a maioridade penal, comprovadamente irá apenas levar o nosso país a um estado de completa anomia. Talvez a melhor situação seja um pacto nacional, envolvendo todos os poderes, classe política e sociedade para que finalmente se dê efetivo cumprimento as leis; e no presente caso especialmente o Estatuto da Criança e do Adolescente, para que a partir de um período considerável tenhamos a experiência necessária, dados e estatísticas das medidas que foram exitosas e as que fracassaram, para que somente após essa constatação proponham-se modificações como esta.”, ela conclui.

 

Revisão Jornal Somos

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