quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Caroline Teixeira descobriu a sua orientação sexual já na vida adulta e teve que equilibrar o novo amor com família, religião e profissão.
Redação Jornal Somos
Após quatro anos em um relacionamento hétero e conturbado, a jornalista e professora Caroline Teixeira decidiu curtir a vida, e, com isso, conheceu a sua até então namorada. Ela conta que os assuntos foram parecidos, um encontro de almas, mesmo nunca tendo se relacionado com uma mulher antes.
''Na época eu nem queria namorar, mas aconteceu. Foi tão natural, que eu falo que não existe um rótulo, eu estou com ela pela pessoa que é, independente de sexo, de qualquer outra coisa, nunca tive problemas com isso''.
A revelação aos pais
Muitas pessoas sofrem com preconceito dentro da própria casa, o que pode gerar muitos transtornos emocionais e dificuldades na vida de quem tem uma orientação sexual diferente de outros. Muitos pais expulsam os filhos de casa, espancam e existem casos de mães e pais que matam seus próprios filhos em razão do preconceito.
Em entrevista ao Jornal Somos, a jornalista contou como foi a reação dos pais com a descoberta.
''Minha família é muito religiosa, somos católicos e durante toda a vida fomos praticantes. Meus pais são ministros da igreja e estão como liderança. No começo foi um baque, minha mãe fala que, assim como quando minha avó paterna faleceu há um tempo, nos primeiros dias meu pai não dormia, quando eu contei, foi do mesmo jeito, meu pai não dormia e ficava a noite toda virando na cama. Mas ele não me falava nada, me perguntou se era isso mesmo que eu queria, se estava preparada para o que eu iria enfrentar na sociedade, porque existe muito preconceito. Eu me lembro dele falar que a igreja não iria me excluir, mas também não iria me acolher, e eu fiquei com isso na cabeça. Existem muitos tabus dentro da igreja sobre homossexualidade e o papa Francisco vem mudando isso demais, acho que isso é de padre para padre. A minha mãe foi mais resistente que ele, foi muito difícil no começo, se eu deixasse um copo no sofá, ela brigava comigo até chegar ao assunto. Mas eles foram para um retiro que se chama “Retiro de Nossa Senhora” que existe no Brasil inteiro, lá eles tinham que fazer uma proposta de algo para cumprir até o outro ano, o próximo retiro. Nesse mesmo final de semana, eu, minhas irmãs e meus amigos fomos para o rancho dos meus primos. Eu e a Jordana (namorada) tivemos que vir embora mais cedo porque ela tinha que pegar um ônibus em Rio Verde. Quando chegamos a Santa Helena, sofremos um acidente, um carro bateu no nosso e demorou muito para que pudéssemos ir para casa. O ônibus, aqui em Rio Verde, era para as 16h e nós saímos de Santa Helena às 17h. Meu pai e minha mãe tinham feito o combinado de inserir a Jordana na nossa família, como eles acolheram o meu cunhado, os namorados das minhas irmãs. Isso aconteceu antes do nosso acidente, como ela perdeu o ônibus, meu pai falou para irmos até Rio Verde, quando chegássemos, pegaríamos o carro e levaríamos ela até Paranaiguara, onde ela mora. Ou seja, duas horas depois do que meus pais tinham prometido, ela estava dentro da minha casa. Acidentes nunca são bons, mas eu falo que esse foi providencial. Ela conheceu meus pais, no desespero do acidente, ela estava meio assustada e morrendo de vergonha, mas eu estava achando aquilo o máximo. Desde então, ela frequenta minha casa, é muito querida pela minha família, pelos meus amigos, o irmãozinho dela de 10 anos adora minha família, adora vir para Rio Verde ficar aqui uns dias. No começo foi difícil, mas acho que tudo que é novo, ainda mais de uma proporção dessas, mas hoje eu vejo que é muito tranquilo''.
A igreja e a homossexualidade
Um caso de acolhimento da parte da igreja, que buscou aceitar Caroline, com amor e fraternidade.
''Meus amigos de verdade nunca mudaram comigo. Tenho muitos amigos da igreja, na época eu coordenava um projeto de jovens e nunca houve mudança de comportamento comigo deles em relação a isso, nós fizemos um retiro e nele tínhamos que contar uma experiência com Deus que tivemos no último ano e eu citei essa experiência, que se isso não fosse providência de Deus, eu não sabia o que era. Porque, antes, minha mãe não queria nem ouvir falar da minha namorada e depois dessa situação, as coisas mudaram. Depois desse retiro, iria ter um novo encontro com quem não participou. O padre me abraçou e disse que ficou muito feliz pelo meu testemunho, que estava muito orgulhoso de mim, por eu não negar quem eu sou, por ser bem resolvida e se eu estava feliz desse jeito, ele estava feliz por mim. Esse encontro era para a equipe que iria trabalhar, que receberia os 90 ou 80 jovens e os coordenadores do encontro me chamaram para dar uma palestra chamada revisão de vida. Era sobre isso, sobre como minha vida mudou, como estava bem com aquilo e para falar da minha homossexualidade. Acho que fui muito querida nesse caso, se fosse em outra época seria muito diferente, tem pessoas que sofrem muito até hoje, pessoas que não assumem por medo ou por vergonha. Eu sinto que não sofri isso, claro que sempre tem quem faz piadas sem graça, joga indireta, mas eu sempre fui superior a isso''.
Caroline comentou também sobre as mudanças que pode haver dentro da igreja e da ajuda do Papa Francisco para que isso aconteça.
''Acho que ainda tem que mudar muita coisa, mas por ser uma religião antiga, não é um processo que vai ser rápido. Ainda existem muitos dogmas, porém vejo que com a vinda do Papa Francisco, isso tem mudado demais. Sempre nos pronunciamentos, ele diz que o importante é o amor. O projeto do qual participo, fala que Deus nos ama independente de qualquer coisa, então, por que Deus vai me abandonar simplesmente pela minha opção sexual? Acho que existe muita coisa pra mudar, mas não é algo relacionado a Deus e sim às pessoas''.
Um exemplo claro de que o amor, respeito e aceitação é o que realmente importa para aqueles que nos cercam e querem verdadeiramente nosso bem.