domingo, 25 de maio de 2025

Morte cerebral de mulher grávida reacende debate sobre consentimento médico e direitos do feto nos EUA

POR Ana Carla Oliveira | 25/05/2025
Morte cerebral de mulher grávida reacende debate sobre consentimento médico e direitos do feto nos EUA

Foto: Reprodução Mais Goiás

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A morte cerebral de uma mulher grávida na Geórgia (EUA) provocou uma série de questionamentos éticos, legais e médicos envolvendo o direito ao consentimento, os limites do cuidado intensivo e as novas interpretações das leis estaduais após a reversão do caso Roe v. Wade.

 

Adriana Smith, uma enfermeira de 30 anos, foi declarada em morte cerebral em fevereiro, quando estava com aproximadamente nove semanas de gestação. Mesmo sem chances de recuperação neurológica, os médicos informaram à família que não poderiam suspender o suporte vital devido às leis do estado da Geórgia. Desde 2019, o estado considera o feto como uma pessoa com direitos legais e proíbe o aborto após a detecção da atividade cardíaca — geralmente por volta da sexta semana de gravidez.

 

Diante disso, os profissionais de saúde optaram por manter Adriana conectada a aparelhos com o objetivo de levar a gestação até, no mínimo, a 32ª semana. A decisão, no entanto, gerou um forte abalo emocional na família. A mãe da enfermeira, April Newkirk, descreveu os meses que se seguiram como uma “tortura psicológica”. “Essa decisão deveria ter sido nossa. Era a minha filha. Estávamos sendo forçados a manter algo que não fazia mais sentido”, desabafou.

 

Newkirk acompanhava visitas regulares ao hospital, muitas vezes levando consigo o filho pequeno de Adriana, que ainda não compreendia a complexidade da situação. O caso levantou preocupações sobre como a legislação, ao restringir o direito ao aborto e reconhecer o feto como pessoa jurídica, pode interferir em decisões médicas íntimas e familiares.

 

Precedente delicado

 

Especialistas apontam que casos semelhantes envolvendo suporte vital prolongado para fetos tão precocemente na gestação são extremamente raros e, até o momento, não há registros médicos confiáveis de desfechos positivos em situações como essa. Em geral, os poucos casos conhecidos ocorreram em estágios mais avançados da gravidez, quando o feto já possui maior viabilidade fora do útero.

 

Farah Diaz-Tello, advogada da organização If/When/How, dedicada a defender os direitos reprodutivos, observa que o caso escancara os efeitos práticos da reversão de Roe v. Wade. Antes da mudança, a decisão sobre a manutenção ou não da gravidez em situações como essa cabia à família ou representantes legais da paciente. Agora, em estados com legislações mais restritivas, essa escolha é retirada da esfera familiar e passa a ser determinada por normas rígidas.

 

“Quando esse poder é retirado, a gravidez se transforma em uma perda assustadora de dignidade para a pessoa grávida”, afirma Diaz-Tello.

 

Um dilema legal e humano

 

O caso de Adriana Smith mostra como as novas legislações sobre direitos do feto impactam profundamente os limites do cuidado médico, do luto familiar e da autonomia corporal. Em um momento em que a família esperava se despedir e iniciar o processo de luto, se viu obrigada a prolongar a espera em nome de uma vida ainda em formação — cujas chances de sobrevivência eram incertas.

 

O debate segue nos tribunais, nos comitês de bioética e, sobretudo, nas famílias que enfrentam, agora, mais dúvidas do que respostas diante de cenários tão sensíveis.

 

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