quarta-feira, 22 de outubro de 2025
Apesar da pressão de entidades e da sociedade civil, o presidente Lula tem resistido à indicação de uma mulher para o STF, expondo tensões entre compromissos históricos com a pauta de gênero e estratégias políticas mais amplas.
A recente aposentadoria do ministro Luís Roberto Barroso reacendeu um debate que há tempos ronda o Palácio do Planalto: a sub-representação feminina no Supremo Tribunal Federal. Com apenas uma mulher entre os onze ministros — a decana Cármen Lúcia —, a Corte reflete um desequilíbrio que contrasta com os discursos progressistas que marcaram a trajetória política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda assim, Lula tem demonstrado resistência em atender aos apelos por uma nova indicação feminina.
Desde o anúncio da vaga, diversas entidades da sociedade civil, como o Fórum Justiça e a Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, intensificaram a pressão para que o presidente escolha uma mulher para o cargo.
A demanda não é apenas simbólica: trata-se de uma reivindicação por representatividade em uma das instituições mais poderosas da República.
Lula, por sua vez, tem adotado um discurso ambíguo. Em eventos públicos, como o realizado em São Bernardo do Campo, o presidente defendeu a autonomia feminina e criticou a violência de gênero. No entanto, na prática, sua hesitação em nomear uma mulher para o STF tem sido interpretada por muitos como uma contradição entre o discurso e a ação.
Aliados do governo sugerem que a resistência pode estar ligada a compromissos políticos com aliados do campo jurídico, além de uma preferência por nomes com os quais Lula já tenha relações consolidadas. A possível escolha de um homem para o STF, contudo, pode ter efeitos colaterais: segundo analistas, a pressão pode se deslocar para outras nomeações, como a chefia da Defensoria Pública da União, onde uma mulher figura entre as favoritas. A decisão de Lula, portanto, transcende a escolha de um nome. Ela se tornou um termômetro da disposição do governo em transformar discursos em práticas concretas de inclusão. Em um momento em que o Brasil discute com mais intensidade a equidade de gênero nas instituições, a indicação ao STF é mais do que uma vaga: é uma oportunidade histórica de corrigir distorções e reafirmar compromissos com a democracia representativa.
Se Lula ceder à pressão, poderá reforçar sua imagem como líder sensível às demandas sociais. Se resistir, corre o risco de alimentar críticas sobre a distância entre suas palavras e suas decisões. Em ambos os casos, o impacto será duradouro — não apenas para o STF, mas para a narrativa de seu terceiro mandato.
Este texto não reflete necessariamente a opinião do Jornal Somos.