quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Redação Jornal Somos
Segundo o Instituto Geledés, o Feminismo Negro surgiu a partir de 1992, em Santo Domingo, na República Dominicana, com a realização do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, criação da Rede de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas e a definição do 25 de julho como Dia da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha.
A Lei nº 12.987/2014 foi sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, sancionou a lei, de autoria da vereadora Marielle Franco, que inclui o Dia da Tereza de Benguela e da Mulher Negra no calendário oficial da cidade. A data passou a ser comemorada anualmente em 25 de julho.
Tereza de Benguela, ou "Rainha Tereza", como ficou conhecida em seu tempo, viveu no século XVIII no Vale do Guaporé, no Mato Grosso. Ela liderou o Quilombo de Quariterê após soldados matarem seu companheiro, José Piolho. De acordo com documentos da época, o lugar abrigava mais de 100 pessoas, com aproximadamente 79 negros e 30 índios. O quilombo resistiu contra a escravidão da década de 1730 ao final do século. Tereza foi morta após ser capturada por soldados em 1770.
Para falar melhor sobre o dia 25 de julho, convidei Brenda Carolinne, jovem mulher, negra e estudante de Ciências Sociais para falar sobre todo o contexto que a sociedade oferece ao povo negro, em especial às mulheres negras, e especialmente como podemos melhorar esse cenário a cada dia.
Pesquisando sobre o dia 25, encontrei muitos comentários do tipo: “o dia da mulher é no dia 8 de março”. Então é aí que entra: qual a importância dessa data e da existência do feminismo negro?
B.: É importante pensarmos que além da misoginia, o colonialismo acaba exercendo um poder opressivo diferente sobre os corpos negros, latinos e caribenhos, justamente por ser um poder racista e eurocêntrico e que tem o objetivo de apagar identidades que fujam do padrão branco-europeu. Então temos que ter uma noção de que as opressões que mulheres negras, latino-americanas e caribenhas vivem são uma realidade diferente das mulheres de outras regiões; sendo o dia 25, importante para pensarmos em alternativas que melhorem o cotidiano dessas mulheres e relembrarmos o quanto o colonialismo teve e ainda tem controle sobre nossos corpos, fazendo com que soframos, atualmente, as consequências de atitudes racistas do passado. E considerando a noção de que corpos latinos, caribenhos e negros vivem realidades diferentes de outras regiões, é necessário pensar-se também que dentro da realidade do continente americano, existe uma dualidade entre o branco e o negro, como consequência do passado colonial e racista, o que torna a realidade destes diferente, sendo imprescindível que exista movimentos raciais que tratem dessa realidade de forma plena e com pautas feitas de negros para negros, assim como o feminismo negro propõe.
O quão importante é o local de fala e a representatividade?
B.: Muitas pessoas negras não se veem nos meios midiáticos e isso cria um tipo de negação em relação a sua própria identidade e é aí que entra a representatividade como um dos vários passos importantes para a construção de uma sociedade mentalmente saudável em relação a sua autoestima. O local de fala é importante para que se possa dar voz aos que normalmente são silenciados, principalmente se pensarmos no continente americano e para que a realidade de pessoas negras, indígenas, lgbt+, mulheres etc seja contada por elas mesmas e respeitando as vivências destas e dando espaço para que elas falam por si próprias, sem intervenção de outros.
Como, no cotidiano, podemos impedir mulheres negras de serem silenciadas como vem acontecendo desde sempre?
B.: Divulgar e estudar sobre autoras negras falando sobre mulheres negras. Basicamente, ouvir o que as pessoas negras, no geral, têm pra falar.
Marielle Franco acreditava que celebrar o dia de Tereza de Benguela seria reconhecer institucionalmente a importância dela e das mulheres negras como agentes da luta pela liberdade e pelos direitos humanos. Marielle Franco foi uma socióloga e vereadora do Rio, que lutava pela justiça ao povo negro e às mulheres. Ela foi assassinada a tiros no Rio, com seu motorista Anderson Gomes, no dia 16 de março. A polícia ainda não fez qualquer prisão relacionada ao crime.
Assim como Tereza, outras mulheres foram e são importantes para a história. Com trabalhos impecáveis e perseverança, elas deixaram um legado, que cabe a nós reverenciarmos e visibilizarmos a emancipação das mulheres negras, como forma de homenagear. Conheça algumas:
Aqualtune
Ela foi uma princesa africana, filha de um rei do Congo ainda não identificado. Em 1665, liderou uma força de dez mil homens na Batalha de Mbwila (cidade localizada na atual Angola), entre o Reino do Congo e Portugal, mas foi capturada com a derrota congolesa. Foi então aprisionada e trazida para o Recife no Brasil, vendida como escrava reprodutora. Mais tarde tomou conhecimento do Quilombo dos Palmares e organizou uma fuga para lá. Ela teria dado à luz Ganga Zumba e Gana, que se tornaram chefes de dois dos mais importantes mocambos de Palmares. Posteriormente ela deu a luz a Sabina, a mãe de Zumbi, o grande líder dos Palmares.
Existe uma lenda na África que os deuses teriam tornado a guerreira Aqualtune em um ser imortal. Ela teria se transformando em um espírito ancestral, que conduziu seus guerreiros até a queda definitiva do Quilombo de Palmares, em 1694. Dizem que até os dias atuais ela é lembrada em Pernambuco e é cantada como a princesa na música de Zumbi de Jorge Ben Jor, que seria uma referência a ela.
Dandara
Dandara foi uma guerreira negra do período colonial do Brasil. Após ser presa, suicidou-se se jogando de uma pedreira ao abismo para não retornar à condição de escrava. Foi esposa de Zumbi dos Palmares e com ele teve três filhos. Dandara dominava técnicas da capoeira e lutou ao lado de homens e mulheres nas muitas batalhas consequentes a ataques a Palmares. Ela se juntou ainda menina ao grupo de negros que desafiaram o sistema colonial escravista por quase um século. Ela participava também da elaboração das estratégias de resistência do quilombo.
Zeferina
De origem angolana, foi trazida ainda criança para o Brasil. Sofrendo com as atrocidades que a escravidão lhe impunha e motivada por sua personalidade transgressora, segundo a historiadora Sílvia Barbosa, ela saiu em luta da sua liberdade.
Zeferina fundou o Quilombo do Urubu e se tornou uma importante personagem das insurreições negras na Bahia no século XIX. Organizou índios, escravos fugidos e libertos, no geral, que queriam a libertação para todos os negros na província de Salvador. Segundo o historiador Walter Passos “uma mulher que conseguiu unificar, em pleno século XIX, homens e mulheres”.
Ela sabia que o quilombo que era um princípio libertador na época, poderia ruir e viu a necessidade de se unir com os nagôs para invadir a cidade e matar os brancos escravocratas. Embora em desvantagem, ela e sua tropa não desistiram da luta. Presa, Zeferina continuou altiva e fiel aos seus objetivos. Ela acreditava que podia fazer muito mais e que mesmo que as batalhas parecessem perdidas havia outros caminhos.
Sueli Carneiro
Filósofa, escritora e ativista antirracismo do movimento social negro brasileiro. Sueli Carneiro é fundadora e atual diretora do Geledés — Instituto da Mulher Negra e considerada uma das principais autoras do feminismo negro no Brasil.
Carolina de Jesus
Foi uma escritora brasileira, conhecida por seu livro Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada publicado em 1960. Carolina de Jesus foi uma das primeiras escritoras negras do Brasil e é considerada uma das mais importantes escritoras do país.
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