sábado, 23 de novembro de 2024
Isabela Scelzi Amaral é advogada tributária e debate um tema que incomoda muita gente ICMS.
Redação Jornal Somos
“Ser empresário no Brasil é atestado de loucura”. A afirmação foi dada por Cristiano Bronzatto, idealizador da marca brasileira de sapatos colecionáveis Louloux, ao site “IG”. Sabemos que a principal razão para tal afirmação tem um ponto de referência. Direta, ou indiretamente, todas as anomalias, enfermidades e sintomas que corroem o empreendedorismo no Brasil estão associados ao governo e a péssima gestão pública que infesta nosso país.
Uma dessas anomalias se intensificou nos últimos tempos e consiste na prática do FISCO em denunciar empresários, com o intuito de enquadra-los como praticantes de crime tributário por deixarem de recolher o ICMS, ainda que a empresa tenha efetuado os devidos registros contábeis e apresentado regularmente as declarações pertinentes para a fiscalização. O interesse do Estado-fisco, com essa postura é arrecadar. Ele sabe que, o receio de ser preso irá fazer o contribuinte pagar até o que não deve.
E o que é pior: as denúncias são recebidas, processadas e, salvo raríssimos casos, resultam em condenações penais em desfavor do administrador da empresa, refutando-se argumentos defensivos quanto à necessidade de se provar a existência de dolo na conduta do empresário, bem como não se aceitando provas da existência de justa causa para o não recolhimento, como por exemplo, sérias dificuldades financeiras da empresa.
Em situações de falta de capital de giro, é praxe as empresas priorizarem o pagamento de funcionários e fornecedores em detrimento ao recolhimento de tributo. Tal atitude é preferível, a fim de evitar a paralisação de seu negócio.
Tal tema, está preste a ser definido, o STJ, em sede de caráter repetitivo, iniciou julgamento do seguinte questionamento: Deixar de recolher o ICMS que foi declarado ao fisco estadual caracteriza crime de natureza tributária?
O tema chegou à 3ª Seção (REsp 1598005) após decisões em sentidos contrários nas turmas de direito penal. No caso em julgamento, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina denunciou criminalmente o sócio de uma empresa que declarou valores de ICMS sobre operações próprias e não os recolheu.
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) manteve a condenação do empresário à pena de oito meses de detenção, em regime inicial aberto e pagamento de 13 dias-multa. Para os desembargadores, há infração ao artigo 2, II da Lei 8.137, de 1990, combinada com o artigo 71 do Código Penal, que trata do crime continuado. O artigo 2º estabelece que é crime à ordem tributária deixar de recolher tributo no prazo legal.
Um dos julgadores do STJ que contribuiu com um dos dois votos pela condenação, citado acima, entendeu que o valor do tributo é cobrado do consumidor. Por isso, não o repassar aos cofres públicos configuraria apropriação prevista na Lei 8.137/90, art. 2º, II. Referido artigo prevê configuração de crime à ordem tributária deixar de recolher o tributo no prazo legal.
Faltam ainda os votos de 6 Ministros para a conclusão dessa relevante questão que afeta provavelmente milhares de contribuintes.
O que se sobressai nesse caso é que o contribuinte declarou ser devedor do imposto não recolhido. Ou seja, não se vislumbra crime de sonegação fiscal, o qual se caracteriza pela omissão da informação sobre a operação realizada e sobre o tributo devido (Lei 8.137/90, arts. 1º, I, 2º, I e 3º, I).
Outrossim, a declaração prestada pelo contribuinte afasta também o dolo - dolo é a vontade consciente de praticar a infração penal, por ação ou omissão.
Nesse contexto, deixar de recolher o tributo já declarado caracteriza, no máximo ilícito tributário punível com multa e juros, se e quando couberem. Jamais infração penal.
Está-se diante de mais uma situação que, conforme para onde pender a decisão do STJ, pode se transformar num contrassenso jurídico que diminui a cada dia o anseio de muitos em empreenderem no Brasil.
ISABELA SCELZI AMARAL
Advogada na área tributária.
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De acordo com a presidente da equipe, Kenia Leite, o objetivo é figurar entre as 5 melhores equipes da competição.