quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Redação Jornal Somos
Sábado, dia 16 de junho de 2018, véspera da estreia da seleção brasileira na copa do mundo FIFA 2018. Um vídeo com pelo menos quatro homens vestidos com camisetas da seleção ao redor de uma jovem de nacionalidade não identificada cantando e estimulando a mesma a cantar, mesmo sem entender o significado, “buceta rosa, essa é bem rosinha” começa a circular na internet. Assim que divulgado, o vídeo toma proporções nacionais e internautas de diversos locais criticam a postura dos homens no vídeo.
Terça-feira, 19, dois homens são oficialmente identificados, o tenente da Polícia Militar de Santa Catarina Eduardo Nunes e Diego Valença Jatobá, advogado, ex-secretário de turismo de Ipojuca (PE). O último publicou em sua rede social a seguinte mensagem. “Peço perdão à todos pela imagem que transmiti. Nunca pensei que uma brincadeira seria capaz dessa repercussão toda, estou muito triste pelo o que vem acontecendo, perdão à todos”.
Aparentemente, o arrependimento se deu apenas pela repercussão que a “brincadeira” teve. Não é de se espantar já que o Brasil é o país em que uma mulher é estuprada a cada 11 minutos e possui a quarta colocação em número de feminicídios, com uma mulher morta a cada duas horas. Os homens identificados no caso são socialmente definidos como “homens de bem”, assim como muitos agressores existentes nas ruas.
Cultura de estupro, machismo, misoginia, cultura patriarcal, todos esses temas estão conectados e precisam ser discutidos. A violência contra a mulher é concreta, sistemática e apresenta números reais e científicos. Não deveríamos discutir o que já está provado, mas infelizmente precisamos. É preciso que a sociedade passe a acreditar no que as mulheres dizem, é preciso que a sociedade pare de contestar o que é ou não estupro. Se há consentimento é sexo, se não, é estupro.
A pessoa pode estar embriagada, vestida de forma sensual, pode já ter demonstrado querer sexo, pode estar nua e na cama e até mesmo já ter iniciado o ato. No momento que ela declara não querer sexo, ou querer interromper o sexo, a ação deve parar. A cultura do estupro é a cultura que torna normal a violência sexual. As pessoas não são ensinadas a não estuprar, mas sim recebem recomendações de atitudes a serem tomadas para que não sejam estupradas.
Cultura do estupro é duvidar da vítima quando ela relata uma violência sexual. É usar o passado da vítima ou sua vida sexual como justificativa. A cultura do estupro é machista. A voz das mulheres é tomada como mentira ou invenção. Na cultura machista as mulheres são melindrosas e os homens são eternas vítimas de nossas calúnias. Mas os números não mentem, e se a lógica machista se baseia na fantasia, o feminismo aponta para a realidade.
É cansativo expor a realidade para quem não quer enxergá-la porque não é diretamente afetado por ela. Por isso precisamos revelar que existe, sim, uma cultura que normatiza o estupro e a violência contra as mulheres. Falar é uma ação, denunciar o machismo é uma ação, revelar a misoginia é uma ação. Pois falemos, então, com a linguagem adequada. A cultura do estupro existe, é visível e foi exatamente isso que os brasileiros demonstraram em seu vídeo.
O pedido de perdão, a exposição, a vergonha internacional, são apenas resultados de uma cultura enraizada na nossa sociedade. O homem que ri desse vídeo e diz que foi apenas uma “brincadeira”, que “hoje em dia tudo é errado” é misógino. A atitude tomada pelos homens do vídeo é repetida diariamente nas ruas de qualquer cidade brasileira, são vividas por centenas de mulheres todos os dias.